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domingo, 20 de novembro de 2011

Consciência colorida


...depois fogueira, brasa e cinza
preto e branca, branco e preta
centelha brasileira, depois...


antes cinza, carvão, brasa e fogueira
preto, branco, amarelo e vermelho
centelha na consciência brasileira

domingo, 13 de novembro de 2011

Sobre as saudades


   As saudades que sinto não me levam as lágrimas, nem tampouco me causam dores. Não é também daquelas que desespera e entristece. As minhas saudades são mais dos objetos do que de pessoas, por não tê-las perdida tanto quanto aos objetos.
   Tenho saudades do tamborete de peroba com assento de couro de boi. O tamborete foi o primeiro degrau que subi para ver o meu horizonte. Tenho saudades da sombra do pé de amêndoas na porta do comércio do meu pai, lá o meu avô Pedro, com seus causos, abriu o meu horizonte para a felicidade. Tenho saudades da rede que eu deitava quando o meu pai me acomodava na madrugada por querer acompanhá-lo na feitura do pão. O horizonte já se mostrava com cheiros e sabores.
   Tenho saudades do bode que eu montava e tendo a casca da laranja como chicote, eu ia como um Dom Quixote sem o Sancho Pança desbrava horizontes, porém, depois da primeira queda e da primeira chifrada, o meu pai resolveu cozinhá-lo. Foi o meu primeiro crime, de tantos que viriam.
   Tenho saudades das experiências de fazer chocolate do cacau; de cortar as patas da centopéia para ver se ela mancava; de prender os pássaros nas mãos e arremessá-lo contra a parede esperando que ele voasse, sendo que todos eles estatelavam na parede; de comer as piabas do rio para aprender a nadar depois de quase morrer após as várias tentativas. O horizonte que deslumbrava, nunca alcancei pelo nado, as águas, nem tanto como as lágrimas, não afeiçoaram a mim.
   Tenho saudades do copo de alumínio com o meu nome grafado, do pilão que minha tia-avó pisava o arroz para a massa de cuscuz, da roda de boi colocada no quintal da casa do meu tio servindo como mesa para jogar felicidade para dentro de nós após jogar conversa fora, de me chamarem pelo apelido de Pelé, da bola de meia, da bola de bexiga do boi, da bola de gude.
   A grande bola que é o mundo girou para me situar onde estou, recheado de saudades dos objetos que me marcaram. Às vezes, sinto-me estranho por não sentir saudades das pessoas, e destas, a única que eu perdi fisicamente foi o me avô Pedro. Julga-me insensível por isso.
   Animicamente, o vô Pedro vive dentro de mim; espiritualmente, ele vive ao meu lado. Ele vive!
   - Vai, chuta a bola.
   - ...
   - Gol de Pelé, gol de Pelé.
   E assim o meu vô Pedro apelidou-me de Pelé. Por doze anos fui chamado pelo apelido, quando me dei conta que esse não era o meu nome, já o tinha esquecido. E nunca entendi de bola.

* Vô, eu sei que você vai ler essa singela homenagem no plano espiritual. É a maneira de lhe dizer que eu te amo e que continuo tentando dominar a grande bola.